Uma tarde sem aplicativos
Na última segunda-feira, dia 4, o WhatsApp parou de funcionar por volta das 13 horas e assim ficou até o início da noite.
Foi uma tarde atípica e difícil porque sou refém do WhatsApp, não tem jeito. Minha mãe começou a ficar nervosa porque achou que a Vivo tinha cancelado a nossa linha. Eu não conseguia enviar a foto de uma receita a ela, embora o wi-fi desse sinais de funcionar bem. Almoçamos, e soube pelo Twitter que o problema não se dava somente com o “zap”, mas também com o Instagram e o Facebook.
Enquanto comia, tentei assistir um episódio de “Downton Abbey”, no Amazon Prime, mas a internet continuava lenta. Meu pai queria pedir um Uber e não conseguia. Achei estranho. Até o Uber? Os únicos aplicativos que funcionavam eram o Telegram e o Twitter. A coisa era séria. Já se falava até no fim do Facebook.
Uma pena, pensei. Tenho vergonha de admitir, mas é por meio do “Face” que fico sabendo dos aniversários dos amigos. Dos mais próximos eu até já sei, mas não de todos. A memória anda falhando.
E nada da volta dos aplicativos do Mark Zuckerberg.
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Às 16 horas, eu estava sozinha em casa e deveria ter aproveitado para continuar a leitura de “Os Amnésicos“, da autora Géraldine Schwarz, editado pela Editora Âyiné. O livro conta a história de sua família na Alemanha nazista: seu avô é proprietário de uma empresa de petróleo comprada de uma família judia a preço de banana. E sua avó era fã de Hitler, pois após ver seu país ser humilhado e crescer na miséria depois do fim da Primeira Guerra Mundial, assistiu a ascensão de um “salvador da pátria” pronto para fazer a Alemanha grande de novo (a História sempre se repete).
Um livro corajoso e necessário, pois vemos na família Schwarz que muitos alemães não-judeus viram as atrocidades do antissemitismo e da eugenia acontecerem e nada fizeram. Dá para traçar semelhanças com os dias atuais.

O livro conta ainda como, após o fim da Segunda Guerra, houve uma amnésia geral, a ponto de alguns carrascos nazistas não serem julgados e ainda ocuparem postos de trabalho no funcionalismo público, nas escolas e no judiciário alemão. Ainda que os EUA e a Grã-Bretanha tenham ficado responsáveis pela “desnazificação” da Alemanha Ocidental no pós-guerra, insistindo em julgamentos contra os crimes do Terceiro Reich, foi pouco, pois alguns oficiais da SS e empresários apoiadores do regime escaparam ou foram absolvidos, enquanto a sociedade alemã seguia em frente. Géraldine mostra isso muito bem. Daí o título do livro.
Só fui retomar a leitura já à noite. Tentei ouvir algum episódio dos tantos podcasts que curto e não consegui. Às 18 horas tentei tirar um cochilo, mas foi em vão porque o sono não chegava.
Arrependi-me de não ter ido ao cinema ver o novo 007. Não vou ao cinema desde que a pandemia começou e sei que as pessoas, assim como eu, ainda têm medo. Mas adoro todos os filmes do James Bond e o ator Daniel Craig. Ainda irei, com duas ou até três máscaras, mas irei.
E em breve tem o Marighella, finalmente com data de estreia: 4 de novembro.
Mas voltando à segunda-feira, o sono não chegou. Somente às 18h30 o WhatsApp finalmente voltou a fazer barulho. Instagram e Facebook também retornaram. E uma tarde pouco tecnológica se tornou tema de coluna. Ainda é possível pensar quando o mundo digital não dá sinal.
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É filha de Jerônimo Figueredo e Maria José Juvenal, um porteiro e uma trabalhadora doméstica. Graças às políticas de inclusão, cursou Letras na PUC-RJ e História da Arte, na Universidade de Navarra (ESP). Atualmente apresenta o Elevador de Serviço, programa da TV Democracia, no Youtube. Fala sobre a vida aqui no Lado B, às quintas-feiras.